Opinião

Desafios do “Descomissionamento Social” na indústria de petróleo

Políticas públicas, esforços regulatórios, soluções de engenharia para a extensão de vida da região produtora do offshore do Estado do Rio de Janeiro são demandas para que no futuro não tenhamos uma "Versão Detroit" brasileira no Norte Fluminense

Por Wagner Victer

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No clássico filme "Full Monty" de 1997, lançado no Brasil com o título "Ou Tudo ou Nada", trabalhadores da cidade de Sheffield, na Inglaterra, desempregados pela desmobilização da siderúrgica que acabara de fechar, decidem se transformar em dançarinos para o público feminino da região, sendo que o único problema é que eles estavam longe dos modelos físicos e da beleza exigidos para a nova atividade.

O premiado filme, dirigido por Peter Cattaneo, uma das relíquias da comédia britânica, sai do campo da ficção e tem paralelo em movimentos similares ao ocorrido com a indústria automobilística na região de Detroit, nos EUA, frente à indústria automobilística oriental, com gravíssimas consequências, o que até se transformou em temas para discussões políticas e acaloradas de campanhas presidenciais, lançando luz sobre a importância de políticas públicas específicas para segmentos econômicos regionais em potencial desaceleração.

Na indústria do petróleo, o declínio da produção de algumas bacias terrestres no Nordeste do país e em algumas áreas offshore, nos chamados campos marítimos maduros, traz uma preocupação muito além do chamado descomissionamento físico das instalações, que, aliás, tem surgido com um viés de recomposição ambiental e até com potencial econômico, mas principalmente a atenção para o chamado processo de "descomissionamento social", sem o qual as consequências seriam potencialmente catastróficas.

O apoio à extensão dos contratos e, consequentemente, à permanência de operadoras em campos maduros, através de diversos níveis de incentivos, como a própria redução do pagamento de royalties incrementais, previstos na Lei nº 9478/97, é um desafio que vai muito além de ações dos órgãos reguladores, especialmente da ANP, que deve dar toda atenção ao tema e buscar convergências entre políticas empresariais e as dos poderes públicos dos diversos níveis.

O natural declínio irá muito além da redução da produção de alguns campos, mas também de uma natural desmobilização econômica que, em conjunto com a redução de royalties, pode agravar a questão social, com o aumento do desemprego e um elevado nível de custeio sem uma correspondente fonte de recursos.

O planejamento adequado da extensão da vida dessa região produtora vai requerer um esforço adicional, algo que, aliás, poucos municípios têm planejado de forma eficaz, como foi a criação do chamado "Fundo Soberano" pela Prefeitura de Niterói, inspirado no modelo norueguês, planejado para suportar o declínio da produção no Mar do Norte.

Por características geológicas de nossa costa, conseguimos, na região costeira central do Estado do Rio de Janeiro, ter duas bacias produtoras: a de Campos e a de Santos, potencializada pelo pré-sal, e até uma outra próxima, a do Espírito Santo, que mitigaram e amorteceram em muito o processo de redução de desmobilização de cada bacia isoladamente. Porém esses efeitos, se não forem planejados, especialmente através da extensão de contratos, podem surgir em um prazo muito breve.

Portanto, o alinhamento de políticas públicas, esforços regulatórios e, principalmente, soluções de engenharia que venham a reduzir o Capex para o desenvolvimento, pelas diversas operadoras, dessas oportunidades merecem ser discutidos de forma muito profunda.

Da mesma forma, a agilização das licenças ambientais para novas fronteiras com potencial produtivo, como a Margem Equatorial e até a Bacia de Pelotas, mesmo não aproveitando o sistema de logística de suporte às operações que devem estar nas proximidades, permite a sobrevivência corretiva de grande parte da indústria instalada na região Sudeste, voltada a serviços, engenharia e fabricação de equipamentos, e até da indústria de construção naval e offshore, como os canteiros e estaleiros.

O número de participantes na antiga Rio Oil & Gas, agora ROG.e, e o próprio ânimo positivo que cercou a exposição e o Congresso, deixou claro que a indústria de petróleo nacional e internacional ainda acreditam no Brasil e no potencial das chamadas áreas maduras, com um grande polo de atenção econômica.

Isso permitirá que, se desenvolvido adequadamente e com a sensibilidade devida quanto às externalidades, possa se prolongar o processo de desmobilização econômica dessas regiões que foram muito importantes por décadas para suportar as atividades da indústria de petróleo e que devem ter toda a atenção nesse processo.

O "descomissionamento social" não pode passar despercebido, não só como um risco, mas também como uma oportunidade, para que no futuro não tenhamos uma "Versão Detroit" brasileira no Norte Fluminense.

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