
Descomissionamento, desafios e oportunidades
Opinião
Descomissionamento, desafios e oportunidades
Como remover de forma sustentável todas as instalações de produção, perfuração e escoamento utilizadas na produção de petróleo? Os custos envolvidos podem passar dos trilhões de dólares!

O mundo já produziu mais de 1,5 trilhões de barris de petróleo e 170 trilhões de m3 de gás, tendo a maior parte dessas produções vindo de bacias terrestres. A primeira unidade de perfuração no mar foi construída para operar no Golfo do México, pela Zapata Oil Company, em águas rasas, e iniciou as operações em 1956. Dados de 2023 indicam que aproximadamente 70% da produção mundial de petróleo ainda vem de bacias terrestres, sendo o restante oriundo de campos marítimos de diferentes profundidades e lâminas d’água.
Quase todos os oceanos já têm unidades de produção de petróleo, em sua grande maioria no Oceano Atlântico (Brasil e África), Golfo do México e Mar do Norte, notadamente na Noruega e Reino Unido, e, mais recentemente, no Leste Africano, em campos de gás.
De acordo com a Wikipedia, o mundo tem em torno de 25.000 campos de petróleo (óleo e gás) ativos, de todos os tamanhos. Outras fontes indicam um número bem maior, de 40.000 campos, sem especificar quantos ainda estão ativos.
Independente do total ainda ativo, 94% dos volumes de petróleo estão concentrados em apenas 1.500 campos, médios e gigantes, de óleo ou gás. A maioria dos campos gigantes estão concentrados no Oriente Médio, mas há campos também com volumes superiores a 10 bilhões de barris em reservas localizados no Brasil, México, Venezuela, Cazaquistão e Rússia.
Ha indicações de que o mundo já perfurou em terra e no mar bem mais que 5 milhões de poços dedicados a petróleo, seja de exploração, de produção, de injeção e outros. A maioria deles nos Estados Unidos, onde há registros de mais de 4 milhões de poços já perfurados, grande parte de poços horizontais dedicados à produção de shale gas e tight oil. Juntamente com os poços, existe toda uma infraestrutura para ser desmobiliada no final da vida desses campos.
O primeiro gráfico neste artigo mostra a evolução da perfuração nos Estados Unidos desde o início das atividades. Observam-se picos de perfurações, principalmente em épocas de maior crise do petróleo.
Grande parte dos poços mais recentes são horizontais em reservatórios não convencionais, onde o descomissionamento é mais complexo e exige custos mais elevados. Por outro lado, houve uma redução do número de poços verticais perfurados.
Além dos Estados Unidos, a Rússia também tem uma quantidade grande de poços perfurados e, de acordo com o gráfico a seguir, ainda há mais de 200 mil poços ativos de óleo e gás.
Além dos poços e de todos os equipamentos adicionais, como colunas de produção, cabeça de poço e linhas de produção, tem ainda todos os equipamentos associados ao tratamento primário e escoamento do petróleo/gás. Estima-se que, dos poços perfurados no mundo, ainda devam estar ativos em torno de 60%, o que daria em torno de mais de 3 milhões de poços para abandono.
Como oscilam em torno de 300 mil dólares os custos estimados de abandono de cada poço e a remoção das linhas de produção, o investimento previsto para o descomissionamento de todos os poços ativos em terra e no mar gira em torno de 900 bilhões de dólares. Trata-se de um mercado que oferece empregos e oportunidades para muitas empresas no mundo. E, ainda, com a venda da sucata, parte dos custos também é recuperado.
Além dos poços, com o fim dos campos, o arrasamento das áreas e retirada das instalações de produção, como tanques, linhas, tanques de tratamento, separadores etc., também se constitui um desafio idêntico. Existe um indicativo de custo que vai de um entorno de poucos dólares a um máximo de 10 dólares por barril equivalente de reservas para o custeio desse desmonte, da limpeza das áreas e remoção dos entulhos.
Pode-se imaginar um valor em torno de US$ 4 por barril, para o descomissionamento dessas instalações. Se considerado que o mundo ainda tem 1,5 trilhões de barris de reservas, com 70% em terra, tem-se algo como 1 trilhão de barris para ainda ser produzido ao longo do tempo e, com isso, poder-se-á calcular algo em torno de 4 trilhões de dólares para limpeza, desmonte, transporte e recuperação das áreas das instalações das unidades de produção. Parte desses custos será recuperado pelo aproveitamento e reciclagem dos materiais ali existentes, quiçá 30% do custo.
Há indicativos de que existam 12 mil unidades de produção offshore para serem descomissionadas com o término das produções desses campos. Esse tipo de descomissionamento é bem mais complexo, porque envolve operações com embarcações, guindastes, portos, estaleiros etc., que tenham capacidade para recebimento dos materiais e equipamentos, à medida que forem sendo desmontados.
As referências são que, em média, os custos para a desmontagem de cada unidade poderão oscilar entre 100 e 300 milhões de dólares, a depender da complexidade de cada uma delas. Se for considerado o valor razoável de 150 milhões de dólares, ter-se-á um total de 1,8 trilhões de dólares, apenas para o descomissionamento dessas unidades. Novamente, há que se considerar que parte desse valor vai ser recuperado com venda dos materiais recicláveis e reciclados, algo também em torno de 30%.
O mundo tem cerca de 3,5 milhões de km de oleodutos e gasodutos espalhados por mais de 120 países, estando a maior concentração nos Estados Unidos, Rússia, Canadá e China. Parte ou todos esses oleodutos e gasodutos, com o fim do petróleo, deverão ser removidos ou recuperados para outros tipos de usos, tais como o transporte de água, a transmissão de energia ou até outras opções.
Caso haja a necessidade de remoção, os custos indicativos são da ordem de 0,2 a 1,9 milhões de dólares por km. Para efeito de cálculo, imaginando-se que somente 40% não serão removidos e o custo da remoção dos 60% restantes estará por volta de 600.000 dólares/km, ter-se-á um custo total de 840 bilhões de dólares para a consumação dessa remoção. A possibilidade também de recuperação de parte dos valores com a venda dos materiais finais, também se constituí algum retorno.
A ideia desse artigo é de trazer à reflexão sobre como proceder quando a chamada era do petróleo começar a declinar. Isto inclui a desmontagem de todas as instalações, incluindo poços, quem pagará a conta, o que fazer com os materiais e equipamentos desmontados, qual valor que eles podem trazer para a economia, quantos possíveis empregos vão ser gerados e quem será o responsável pela fiscalização de todas essas atividades.
Somente considerando o upstream e basicamente óleo, o mundo se deparará com um custo de mais de 7,5 trilhões de dólares, chegando até 8 trilhões se forem considerados mais 500 bilhões para a recuperação de todas as áreas degradadas, a devolução para seus antigos donos ou a transformação em parques daquelas que já são do estado. Se o petróleo continuar sendo produzido até o ano 2100, teremos então um dispêndio anual nos próximos 75 anos de mais de 100 bilhões de dólares por ano.
Estará a sociedade e a indústria em particular preparadas para empregar todos esses recursos para tirar o petróleo da nossa matriz energética?