Opinião

Perspectivas do shale gas e tight oil no Brasil e América do Sul

A potencial reserva de shale gas e tight oil e gas do Brasil pode ser superior a 15 vezes as reservas de gás convencional e na América Latina podem ser 20% das reservas mundiais de gás não convencional

Por José Almeida dos Santos

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Coautores: Kazumi Miura e Bruno Leonel 

A indústria de petróleo do Brasil é relativamente jovem comparada com a do México e Venezuela, onde o petróleo foi descoberto em 1910 e 1922 respectivamente, enquanto no Brasil o primeiro óleo jorrou em 1941. México e Venezuela ainda têm atividades monopolizadas, diferente do que acontece hoje no Brasil.

Além desses dois países, figura em destaque na América do Sul dois outros países; a Colômbia, com uma indústria de óleo e gás bastante atuante e parecida com a do Brasil, e a Argentina, cuja indústria de exploração e explotação em reservatórios não convencionais se desenvolveu de forma espetacular, tornando-se uma das líderes mundiais nesse setor, atraindo grandes empresas para essas atividades.

A tabela a seguir mostra um potencial de quase um trilhão de m3 de gás convencional como reservas 3P e Contingentes nas bacias brasileiras já avaliadas, com uma produção média de mais de 150 milhões de m3/dia (2023), ou produção anual de quase 55 bilhões de m3/ano. Portanto, mantidas as produções e reservas atuais, estes volumes garantiriam a produção por cerca de 20 anos.

Porém, conforme dados da ANP e adotando-se a premissa de analogia ao Barnett Shale americano, o Brasil teria cerca de 16 trilhões de m3 de gás não convencional, somente nas bacias listadas abaixo:

  • 2,0 trilhões de m3 na Bacia do Parnaíba (PI, MA, PA, TO, BA e CE);
  • 3,5 trilhões de m3 na Bacia do Parecis (MT e RO);
  • 1,8 trilhões de m3 na Bacia do Recôncavo (BA);
  • 2,2 trilhões de m3 na Bacia do São Francisco (MG, BA, GO e TO);
  • 6,5 trilhões de m3 na Bacia do Paraná (MT, MS, GO, MG, SP, PR, SC e RS).

Em um relatório detalhado datado de 2015, a agência americana EIA estimou que nas bacias sedimentares brasileiras poderia haver um volume de 18 trilhões de m3 tecnicamente recuperável. No mapa publicado pelo Ministério de Minas e Energia (MME), o volume total, se confirmado, indicaria em torno de 10% do volume de gás não convencional mundial, hoje estimado em mais de 200 trilhões de m3.

Fonte: MME, 2022, com base em dados da EIA.

Mesmo sem considerar as bacias do offshore, os potenciais recursos de reservatórios não convencionais do Brasil são da ordem de 16 a 18 trilhões de m3, representando um grande potencial para futuras investigações e desenvolvimento, caso haja autorização. Temos portanto como garantir a produção de gás por um período muito mais  longo se contarmos apenas com o gás convencional.

A América Latina, incluindo o México, é bastante rica em gás de reservatórios não convencionais, de acordo com estudos da EIA feito nas principais bacias sedimentares do continente. Conforme mostra a tabela, com valores expressos em TCF, os maiores potenciais estão na Argentina, México, Brasil e Venezuela. Recentemente, o Chile e o Paraguai tiveram grandes avanços.

Todos os estudos apontam que o shale gas, por ser bastante abundante, poderá contribuir para o aumento da produção de gás na região. Atualmente, a Argentina está se tornando uma exportadora de hidrocarbonetos de suas jazidas da Vaca Muerta, algo jamais imaginado há alguns anos, devido a determinação política e escassez de gás para seu consumo interno. 

A tabela mostra as reservas de gás convencional da América Latina e México e o potencial já estudado do volume de gás dos reservatórios não convencionais. A região é bastante rica em gás não convencional com volume de gás in place próximo de 200 trilhões de m3, com estimativas de reservas superiores a 54 trilhões de m3, um quarto das reservas mundiais.

A presença de gás natural nos folhelhos é fato conhecido de longo tempo, mas somente com os avanços da tecnologia foi possível vislumbrar essa riqueza como um potencial possível. A tecnologia de perfuração e procedimentos em geral na década de 80 nos Estados Unidos trouxeram as ferramentas para tornar essa exploração e produção possíveis em todo mundo.

O uso da telemetria para guiar a direção dos poços, a terceira geração de poços horizontais com possibilidade de múltiplos estágios, o fraturamento de múltiplo estágio com a mistura de água, químicos e areia para permitir a liberação dos gases e uso de nano partículas para manter a extração por um período mais longo foram fundamentais para o estágio atual da indústria nos Estados Unidos e em outros países.   

No Brasil, a Resolução da ANP nº 21/2014 determinou parâmetros legais e técnicos para regulamentar o fraturamento hidráulico no país. Porém, tramita na Câmara dos Deputados um Projeto de Decreto Legislativo (PDC 1.466/2014) que susta a aplicação dessa resolução.

Outras medidas legais sobre o tema são a Lei nº18.947/2016, que suspende por 10 anos o fracking no Paraná, e o Projeto de Lei nº 834/2016 da Assembleia Legislativa de São Paulo, que proíbe a aplicação do fraturamento hidráulico na exploração de xisto no estado.

A oposição à técnica também fez com que a 12ª Rodada de Licitações, ocorrida em 2013, tenha sido alvo de disputa judicial. Nos estados de Alagoas, Sergipe e Bahia, o Ministério Público Federal conseguiu cancelar a assinatura dos contratos de concessão de diversos blocos onde era explorado o gás de folhelho utilizando a técnica de fracking.

Além disso, a Ação Civil Pública nº 5005509-18.2014.404.7005 suspendeu os efeitos do contrato de concessão de blocos na Bacia do Recôncavo.

Temos que aguardar novas tratativas de avanços com as demonstrações concretas de risco reduzido para o meio ambiente com os avanços tecnológicos.

A única exceção no Brasil é na produção de óleo e gás dos folhelhos Irati na Bacia do Paraná.

A ANP aprovou o Plano de Desenvolvimento (PD) do campo de xisto São Mateus do Sul, localizado na Bacia do Paraná. A empresa chamada de Paraná Xisto Ltda opera o campo com 100% de participação. A área de desenvolvimento é de 80,32 km², com o fluido principal sendo o óleo.

A produção de hidrocarbonetos do campo de xisto São Mateus do Sul ocorre a partir de folhelhos negros permianos da Formação Irati. Sobre o sistema de produção e escoamento, o início do processo industrial acontece com a mineração do folhelho a céu aberto.

Tanto os estéreis da mina retornam para áreas anteriormente lavradas recompondo, assim, a topografia original.

Atualmente a mina produz 5.880 t/dia de material e aproximadamente 4.000 barris/dia de óleo, mais gás, nafta industrial e enxofre. É operada pela empresa do grupo da Forbes & Manhattan (F&M) canadense. O modelo usado no Canadá para a produção desse tipo de reservatório, via fracking, poderia ser testado, já que no Canadá também era produzido somente via mineração até anos 1990. Atualmente os dois processos convivem para produção.

O mapa indica o potencial de reservas de gás não convencional, em torno de 200 trilhões de m3, no mundo por país e por continente, com destaque para América Latina com mais de 10% dos potenciais recursos.

Entendemos que o aprofundamento dos estudos para entender melhor todos os possíveis recursos no Brasil e como explorá-los e produzí-los deveria ser de competência do governo, via ANP.

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