Opinião
Reoneração dos combustíveis, o futuro da PPI e os efeitos sobre a inflação
Reoneração de combustíveis deve impactar a inflação de março, mas tende a ser mais que compensada pela melhora da inflação esperada que acompanha o alívio fiscal, com a Petrobras ganhando tempo para definir sua nova regra de preços enquanto mantém a PPI
Desde a posse do atual governo havia uma queda de braço velada sobre a recomposição dos tributos federais e estaduais sobre combustíveis. De um lado, a Petrobras e a Casa Civil temendo uma recomposição imediata que aumentasse a inflação e minasse a popularidade do governo, e do outro, o Ministério da Fazenda precisando recompor as receitas, já que o governo anterior cortou os tributos para baixar a inflação e se beneficiar no cenário eleitoral.
Só que essa medida causou perda de arrecadação e não há ajuste fiscal assimétrico, ou seja, é preciso ajustar os gastos, mas também as receitas. Além de estados que perderam recursos para investimentos sociais. Com o impasse, a Fazenda adotou seu primeiro pacote de medidas que tinha caráter jurídico, buscando aumentar as receitas por meio de cobranças de impostos devidos e pela volta do voto qualificado no CARF, órgão colegiado da Fazenda que tem representantes dos contribuintes devedores e da Receita Federal. Com esse voto, o desempate em disputas jurídicas favoreceria o governo. Porém, o lobby de empresários fez com que o Congresso pedisse ao Planalto para retirar esse voto, que passou apenas a desempatar, mas isentando o devedor de juros e multas. O pacote falhara em recompor receitas.
Sem uma regra de gastos definida, os holofotes se voltaram novamente para os tributos sobre combustíveis. A ideia macroeconômica gerava um dilema: a recomposição aumenta a inflação e tende a fazer o Banco Central aumentar os juros, mas a não melhora da receita piora o fiscal e pressiona a inflação esperada.
Porém, a primeira percepção se refere a uma alta da inflação corrente e de uma só vez, que deve se refletir no IPCA de março. No médio prazo, a recomposição de tributos, ao melhorar a arrecadação, alivia o fiscal e as expectativas de inflação, ou seja, há uma melhora na inflação esperada. E esta é mais importante para o horizonte relevante do Banco Central, que assim tem mais chances de cortar os juros, já que há retirada de prêmios da curva de juros e da taxa de câmbio. Isso pesou no Planalto e a Fazenda conseguiu recompor os tributos de gasolina e diesel, mas sem tanto impacto que teria na inflação.
Isso porque a PPI (Política de Paridade de Importação) continuará sendo seguida até maio e o timing foi correto, pois o preço do brent havia caído quando da decisão de recompor os tributos. Com a taxa de câmbio estável, a política permitiu corte de preço da refinaria para a distribuidora, o que amorteceu a alta de preços da distribuidora para os postos. O aumento ao consumidor foi menor que o esperado. O adiamento da regra de preços foi positivo porque o mercado leria como uma resposta à reoneração.
A recomposição é a volta à média anterior, antes do corte de tributos, então o alívio fiscal é parcial e o governo segue pressionado para apresentar uma regra de gasto ainda no mês de março, também para gerar menos incerteza sobre a política de preços da Petrobras. A companhia, por sua vez, ganha tempo para elaborar nova política se valendo do preço do brent, que apesar da euforia com a China, não deve subir substancialmente por conta da apreciação do dólar global, num contexto em que o real brasileiro segue mais resiliente, ou seja, a PPI mantida não deve implicar altas na refinaria.
A gasolina teve ajuste de 0,47 reais e o etanol de 0,02, já que gasolina é combustível fóssil e deve ser mais taxado, mas na prática o aumento foi de 0,34 reais da gasolina na bomba por conta da redução do preço pela PPI na refinaria. Essa recomposição será parcial não só na gasolina (alta desejada de 0,69 reais) e etanol (alta desejada de 0,24) como no querosene de aviação (QAV) e GNV, que seguem isentos até o final do ano. Para compensar isso, a Fazenda impôs um imposto gradual (em 4 meses) sobre exportação de óleo cru, o que agrada ao governo na ideia de incentivar o refino. Porém, complica o plano de investimentos da Petrobras, já que exportação é parte da demanda da empresa que tende a encolher com a tributação.
Osmani Pontes é economista, com MBA em mercados de derivativos, opções e futuros pelo INSPER e em gestão de portfólios cambiais pela EPGE/FGV.