O cálculo político da Margem Equatorial
Opinião
O cálculo político da Margem Equatorial
Há que se analisar três dimensões nesse quadro decisório: institucionalidade, contexto externo e economias de escala
A recente autorização do Ibama para o desenvolvimento de pesquisas para medir potencial de retorno na exploração de petróleo na bacia da Foz do Amazonas traz uma discussão importante a respeito do processo político que envolve toda essa circunstância.
A expressão é processo político porque em última instância trata-se de uma escolha que cabe no limite ao Presidente da República, que pondera argumentos favoráveis e contrários e toma sua decisão, portanto política.
Os graus de complexidade associados são diversos, uma vez que um possível acidente na região teria potencial avassalador para o Brasil, sua economia e reputação internacional. Por outro lado, a exploração de petróleo naquele que pode ser o novo oásis de óleo e gás é capaz de colocar o Brasil em novo patamar de desenvolvimento social e econômico. Sendo assim, os pesos atribuídos a cada lado do debate são frutos de escolhas e motivações políticas.
Dito isso, há que se analisar três dimensões nesse quadro decisório: institucionalidade, contexto externo e economias de escala. No que diz respeito ao ponto de vista institucional é preciso considerar que no âmbito da Petrobras, há um robusto estoque tecnológico, fruto da excelência do quadro técnico da empresa e dos massivos investimentos em P&D ao longo dos últimos 3 anos.
Esse estoque de tecnologia é capaz de lidar com toda sorte de riscos, seja pela via do monitoramento, seja pela própria situação de contingência e contenção de danos.
No âmbito do Ibama, é preciso destacar que se trata de uma agência reguladora que age para zelar pelo meio ambiente e aprovar ou não empreendimentos que afetem direta ou indiretamente os diversos biomas brasileiros. Como toda agência reguladora tem seu tempo que difere do tempo da política.
Se o Ministério de Minas e Energia tinha pressa, o Ibama tinha seu compromisso com o mandato constitucional e precisava autorizar ou não com base em requisitos estritamente técnicos. Graças à autonomia do regulador, a decisão tomada é livre de quaisquer suspeitas de regularidade ou não. Não deveria haver questionamos sobre isso até porque a autorização se refere às pesquisas e não, ainda, à extração de óleo em si.
Foi muito comentado na imprensa sobre um possível timing ruim da decisão que ocorreu às vésperas da COP 30 de Belém, mas essa ocorrência é justamente uma comprovação de que a atuação do Ibama foi isenta de pressões políticas do ministério ao qual faz parte, o do Meio Ambiente.
Sobre o contexto externo, infelizmente o mundo vê uma regressão do conjunto de práticas verdes que visam a melhoria da composição do investimento em prol dos combustíveis não fósseis. O recente desmonte da aliança dos bancos globais pelo Net Zero é o ícone dessa virada de chave que se consolidou com o retorno de Trump à Casa Branca.
Fechar os olhos para a captação de retornos em fósseis é tapar o sol com a peneira e reconhecer isso passa longe de abandonar os projetos verdes com foco na transição energética para a energia limpa. Mas o momento é de complementação de fontes de energia.
Nesse aspecto, mais do que nunca aumentam as obrigações do Brasil em se comprometer com a alteração da matriz energética. Uma oportunidade promissora é, em eventual regulação da exploração na Margem Equatorial, exigir como contrapartida que parcela relevante das receitas das empresas que explorarem a região seja direcionada para o Fundo Amazonas, tanto para projetos verdes, quanto para contingenciamento em caso de desastres ambientais.
Analogamente, é esperado um plano, a várias mãos, sobre como a sociedade civil e autoridades devem proceder na realização de possíveis riscos. Aproveitar os retornos da Margem Equatorial é justamente o oposto de abandonar a agenda verde que deve se fortalecer de maneira mais que compensatória ao risco assumido.
Finalmente, olhando para a produção de petróleo e para toda a cadeia de óleo e gás, a exploração na Margem Equatorial traz economias de escala justamente para o desenvolvimento de tecnologia da própria Petrobras.
Na medida em que a produção e a receita total com a venda de petróleo aumentam, os custos associados aos investimentos no desenvolvimento de novas tecnologias diminuem. Afinal, uma mesma tecnologia desenvolvida pela empresa serve para otimizar a produção e a exploração em qualquer bacia operada pela Petrobras.
Assim, acréscimos marginais de conhecimento técnico (que incluem a prevenção e a contenção de danos ambientais) tornam-se cada vez menos custosos, contribuindo para aumentar ainda mais o estoque de tecnologia da empresa, fato que justifica ainda mais a estabilidade e segurança da exploração de petróleo na região.
Assim, as preocupações da sociedade não devem ser minimizadas e o governo Lula tem um passivo nesse aspecto por conta do erro de Belo Monte.
No entanto, o fato de a decisão ser política é longe de ser um problema, pois é assentada sobre um vasto debate técnico com pontos fortes de ambos os lados. Aos mais temerosos e recorrendo a algum pragmatismo na análise, é difícil imaginar que, caso Lula rejeite a operação na Margem Equatorial, algum governo futuro fará o mesmo. E nada garante que algum governo futuro terá o comprometimento ambiental e que garanta a autonomia institucional (Petrobras e Ibama) que verifica-se até aqui no atual governo.



