Opinião
Formação de Talentos: futuro incerto e nada promissor
O que se observa não só no Brasil, mas em várias partes do mundo, é uma redução cada vez maior do número de entrantes em cursos de nível superior nas carreiras ditas STEM
Considerando o cenário atual em que mais de 80% do consumo de energia mundial ainda vem de fontes fósseis como óleo, gás e carvão, ainda temos uma longa jornada até uma transição energética efetiva. Há uma corrida mundial por tecnologias e soluções que possam tanto substituir, ou reduzir, a dependência das fontes da matriz energética atual, quanto reduzir a pegada de carbono das fontes fósseis.
Assim, o mundo busca, através de pesquisa, desenvolvimento e inovação formas de eletrificar a produção e exploração de petróleo, otimizar processos e minimizar riscos e custos; desenvolver tecnologias para Captura, Uso e Armazenamento de Carbono; formas de viabilizar novos combustíveis como o hidrogênio verde; novas tecnologias para uma maior produtividade, eficiência e até mesmo novas rotas para a produção de biocombustíveis; painéis solares e baterias mais eficientes e de produção menos poluentes; novas tecnologias de baterias e uso de baterias de segunda vida; turbinas eólicas onshore e offshore e outros diversos processos que podem auxiliar na “defossilização” da matriz energética.
O Brasil tem excelentes exemplos de como o investimento em pesquisa pode alavancar a economia e fazer a diferença para o país. Vejamos os investimentos para desenvolvimento de biocombustíveis, aeronáutica e de tecnologias para produção de petróleo em águas profundas e ultra profundas, áreas em que somos líderes mundiais e exemplos a serem copiados. Em outros cenários já despontamos como grandes atores como geração de energia eólica, hidrogênio verde e até mesmo novas baterias e células combustível.
Entretanto, tudo isso passa por uma questão fundamental, a necessidade de pessoal especializado, bem formado e focado em pesquisa, desenvolvimento e implementação de novas tecnologias. Mas o que se observa não só no Brasil, mas em várias partes do mundo é uma redução cada vez maior do número de entrantes em cursos de nível superior nas carreiras ditas STEM, acrônimo em inglês das palavras Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática.
Um exemplo crítico são os cursos de Engenharia no Brasil, há vários casos de cursos com baixa procura, tendo mais vagas que candidatos, e isso até mesmo em universidades consideradas muito boas. Além disso, temos uma fuga de cérebros para o exterior, visto que outros países passam pelo mesmo processo e buscam aqui a mão de obra qualificada que não conseguem formar nacionalmente.
Dois casos interessantes são a Noruega, onde cursos de graduação e pós-graduação estão fechando por todo o país, e os EUA, onde pesquisas indicam que muitas pessoas já não veem necessidade de um curso superior, visto o tempo gasto a mais para entrada no mercado de trabalho em comparação com um aumento marginal nos salários.
No caso do Brasil, logicamente, há questões relacionadas ao mercado de trabalho, mas este continua bem aquecido para engenheiros com boa formação, a se considerar a busca das empresas por pessoal qualificado diretamente dentro de grupos de pesquisa, e com salários altos. A redução de entrantes nos cursos de graduação já leva a uma sensível redução nos candidatos aos cursos de pós-graduação e, consequentemente, a uma redução do nível de pesquisa nacional.
Observando a situação brasileira, pode-se sempre argumentar com a falta de oportunidades para engenheiros e mais ainda para mestres e doutores. Por outro lado, em diversos setores da economia, vagas para pessoal especializado não estão sendo preenchidas e, mesmo em grupos e centros de pesquisa de grandes instituições, há uma grande dificuldade na atração de talentos.
Observamos um futuro complexo e não muito promissor. Precisamos cada vez mais de pessoal especializado e bem formado, mas ao mesmo tempo estamos formando pouco e com interesse cada vez menor das novas gerações. Com isso, são menos empregos gerados, uma desindustrialização cada vez maior e empregos de qualidade cada vez pior e de baixa remuneração, com grandes reflexos na economia.
Fazendo a ligação com as áreas de pesquisa, o desinteresse, aqui por diversos motivos, por cursos relacionados à área de produção e exploração de petróleo levam a refletir em como vamos enfrentar mudanças climáticas. Precisamos de processos, como preconizado pelas Nações Unidas, de captura e armazenamento de carbono, uma área em que o Brasil pode ser líder mundial, no entanto, nem engenheiros e geólogos/geofísicos especialistas em reservatórios, ou mesmo de produção e/ou equipamentos subsea estamos formando.
O cenário futuro de desenvolvimento de tecnologias locais é extremamente desafiador e talvez impossível de se concretizar. A quase totalidade de novas tecnologias é apenas importada e os breves espasmos que geram boas ideias que podem ser exportadas, são apenas isso, espasmos. Esse são insuficientes para mudar o cenário nacional, nos colocar como líderes no desenvolvimento de alguma área, como já fomos no passado e, o mais importante, segurar os cérebros nacionais no país para que possam desenvolver aqui suas próprias empresas e gerar riqueza localmente, como fazem muitas das potências mundias.