Opinião

As crescentes atribuições dos reguladores na transição energética

O aumento das prerrogativas da ANP com duas novas leis e um decreto deveria incluir a análise sobre como capacitar a agência com recursos financeiros, humanos e digitais para cumprir este mandato. Mas o contingenciamento de recursos e os cortes orçamentários colocam em dúvida tal capacidade

Por Ieda Gomes

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Recentemente foram sancionadas leis e decretos que visam impulsionar a transição energética no Brasil. A Lei 14.948/2024 estabelece o marco legal do hidrogênio de baixa emissão de carbono e a Política Nacional do Hidrogênio de Baixa Emissão. Já a Lei 14.993/2024 cria programas para incentivar a produção e uso de combustíveis sustentáveis, como diesel verde, SAF e biometano (Combustíveis do Futuro). O Decreto 12.153/2024 altera o Decreto nº 10.712/2021, tratando de atividades relacionadas ao transporte, escoamento, tratamento, estocagem e comercialização de gás natural.

Esses marcos legais ainda precisam ser regulamentados, o que pode levar meses ou anos para sua plena efetividade. A Agência Nacional do Petróleo (ANP) será fundamental nesse processo, exercendo um papel de regulação, supervisão e fiscalização.

A Lei 14.948 (H2) atribui à ANP a responsabilidade de regular, autorizar e fiscalizar a produção de hidrogênio e seus carreadores no Brasil, incluindo a supervisão do Sistema Brasileiro de Certificação do Hidrogênio (SBCH2). Isso envolve regulamentar diretrizes, padrões de certificação e monitorar empresas certificadoras.

A Lei 14.993/2024 (Combustíveis do Futuro) exige que a ANP regule e fiscalize combustíveis sintéticos, derivados de rotas tecnológicas alternativas, além de atividades de estocagem geológica de dióxido de carbono. A agência também será responsável por estabelecer padrões de emissões no ciclo de vida da produção de SAF e definir o percentual obrigatório de adição de diesel verde ao diesel comercializado. No caso do biometano, a ANP vai calcular a redução de emissões e fiscalizar o cumprimento das metas de redução de gases de efeito estufa (GEE).

O Decreto 12.153/2024 (Gás para Empregar) obriga a ANP a determinar a redução da reinjeção de gás natural, aumentar a produção de gás nos campos já em operação, após oitiva dos operadores e revisar os planos de desenvolvimento de campos para melhorar o acesso a gasodutos e instalações de processamento. A ANP também poderá ajustar contratos de suprimento e acesso a infraestruturas quando houver conflito com normas ou práticas internacionais.

A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) deverá elaborar o Plano Nacional Integrado das Infraestruturas de Gás Natural e Biometano, além de realizar chamadas públicas para avaliar a demanda de serviços e identificar o potencial de oferta e demanda de gás natural. A ANP supervisionará esses processos e poderá apoiar a EPE na preparação das chamadas públicas.

A ANP também poderá firmar termos de ajustamento de conduta com agentes do setor, caso identifique comportamentos que dificultem a abertura do mercado ou a liquidez, prejudicando a oferta ao consumidor ou os objetivos do Decreto nº 12.153/2024.

Além das atribuições específicas desses marcos legais, a ANP deverá ainda colaborar com outras agências, como a Antaq e a Aneel, na consecução de diversos objetivos e também com a EPE, especialmente no contexto do Decreto 12.153/2024.

O aumento significativo das prerrogativas do órgão regulador, acoplado ao amplo escopo de suas atribuições existentes, deveria ser seguido de analise imediata sobre como capacitar a ANP com recursos financeiros, humanos e digitais para cumprir seu mandato de viabilizador e garantidor da segurança de abastecimento e da transição energética no País.

O atual contigenciamento de recursos e cortes orçamentários constitui uma grande interrogação sobre a rápida e eficaz regulamentação das Leis e Decreto acima mencionados e colocam em risco o futuro papel do Brasil como grande produtor e utilizador de combustíveis verdes e de baixo teor de carbono.

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