Opinião

As restrições de capital ao setor petróleo e efeitos no Brasil

A oferta global de crédito apresenta restrições e impõe desafios para os projetos de companhias do setor no mercado doméstico

Por Osmani Pontes

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As companhias de energias fósseis enfrentam dificuldades em obter financiamentos bancários na medida em que os empréstimos do sistema financeiro para o setor variam a taxas decrescentes após o Acordo de Paris de 2015. Essa modalidade de financiamento ainda é a principal para as empresas de óleo e gás, seguida pelos fundos de pensão.

No que tange à própria característica das empresas de energia fóssil há os chamados stranded assets que são as reservas fósseis, portanto ativos das empresas que por questões regulatórias sofrerão conversão em passivos. O quadro configura elevação da vulnerabildade do setor que também sofre com ciclos mais frequentes de queda dos preços do petróleo desde 2013, reduzindo os lucros das empresas.

Há redução no apetite para empréstimos dos bancos que se deparam com obstáculos que vão alem dos impostos pela regulação ESG. O principal diz respeito ao hedge que o sistema bancário precisa assumir para conceder empréstimos. Para equilibrar os balanços, os bancos precisam assumir passivos de baixo risco para compensar a assunção de ativos de risco crescente como os empréstimos para financiar projetos de energia fóssil.

Para bancos não americanos a alternativa é demandar dólar futuro, que no recente ciclo de apreciação da moeda americana e aumento da aversão ao risco vem apresentando elevados prêmios tornando o instrumento bastante caro. Os bancos americanos demandam contratos de petróleo futuro para travar preços de venda que neutralizem eventuais perdas. Porém, o ciclo de aperto global de liquidez também encarece os contratos o que se configura uma escassez de ativos seguros no mercado internacional.

Esses fatores tornam o financiamento à energia fóssil mais custoso e arriscado que o financiamento de energia renovável, que também é mais barata, facilitando a geração de lucros no setor verde onde há exploração de economias de escala.

Hoje, a maioria dos bancos globais integra a Net-Zero Banking Alliance, NZBA. Trata-se de um acordo firmado entre bancos que se propõe a divulgar metas intermediárias, até 2030, e de longo prazo, até 2050, se comprometendo a atingir a neutralidade de gases de efeito estufa emitidos.

Porém, há diferenças entre os bancos europeus e os não europeus. Desde o Acordo de Paris os bancos que mais concederam empréstimos ao setor foram: JP Morgan (434 bilhões de dólares), Citibank (332 bi), Wells Fargo (319 bi) e Bank of America (281 bi), todos dos EUA. Avaliando por tipo de derivado, o financiamento para gás natural é oferecido predominantemente por bancos japoneses (sobretudo Mizuho), enquanto que para projetos de carvão mineral pelos chineses (CITC e Everbright).

Ano passado, o Royal Bank of Canada concedeu mais de 45 bilhões de dólares em empréstimo, seguido pelo JP Morgan com 42 bi como os maiores ofertantes de empréstimos. Juntos, o sistema bancário do Canadá e dos EUA entregaram 700 bilhões de dólares em média para o setor entre 2022 e 2023.

Avançando ainda mais na análise, nota-se que há uma disparidade na informação uma vez que enquanto a soma dos lucros das maiores empresas do setor (ExxonMobil, Chevron, Shell, Total e BP) apresentou crescimento médio de mais de 100% de 2021 para 2022, o financiamento cresceu em proporção similar somente para os projetos já existentes. O recurso para novos projetos foi encerrado em todos os bancos, exceto por parte do RBC.

Enquanto as maiores companhias do planeta buscam alternativas, as parcerias para as empresas brasileiras se tornam mais difíceis, seja pela redução de projetos subjacentes, seja pela menor possibilidade de diluição de custos de operação. A nível macroeconômico nota-se potencial redução da entrada de novos recursos no Brasil e a nível micro a rigidez de expansão das taxas de lucro do setor.

Via de regra há duas possibilidades em aberto. A primeira é o cenário servir de incentivo à entrada no segmento de energias limpas e a segunda é a deterioração das condições de empréstimos das empresas de óleo e gás no país, que se veriam obrigadas a assumirem compromissos de direcionar parcela dos recursos captados a projetos de transição energética. A depender do desenho do aparato regulatório, esse caminho pode ser o que melhor compatibiliza os diversos interesses para o desenvolvimento setorial.

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