Opinião

O Poder Legislativo nas tecnologias e na transição energética

Fato é que, aparentemente, o mercado e os agentes ainda discutem a necessidade de regras mais claras e detalhadas que garantam a segurança jurídica para o investimento nesses novos potenciais energéticos

Por Frederico Accon

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Coautor: Mariana Saragoça

 

Ao longo das últimas décadas, muito se discutiu sobre o papel do Poder Legislativo na organização e desenvolvimento do setor elétrico brasileiro, passando pela instituição de marcos legais para exploração de potenciais energéticos e para a comercialização de energia elétrica, a definição de modelos e regimes econômicos, o tratamento às concessões de serviço público ou mesmo a criação e a extinção de encargos e subsídios.

Mais recentemente, a participação do Legislativo ficou ainda mais em voga nas discussões do novo marco legal para a chamada modernização do setor elétrico, as discussões para a definição das regras para exploração da micro e minigeração distribuída ou ainda na proposição de Projetos de Decreto Legislativo que acabariam por impactar ou alterar decisões ou regras estabelecidas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), como o destacado no artigo O Congresso Nacional entre a canetada e a redução estrutural das tarifas de energia.

Já destacamos a relevância da participação do Poder Legislativo na estrutura e organização do setor elétrico e todos os impactos de sua atuação como nos Impactos da mora para a geração distribuída.

Fato é que embora tenha se observado relevantes discussões no âmbito do Congresso Nacional, entende-se que, por muitas vezes, a atuação do Poder Legislativo acaba por adentrar questões estritamente técnicas e que seriam de competência de outras instituições do setor, em especial, da Aneel e, por várias outras vezes, as discussões, muitas vezes enviesadas por interesses políticos, acabam se prolongando por vários anos, o que pode custar a perda de significativas oportunidades para país.

Este entendimento fica ainda mais evidente se observarmos que a chamada modernização do setor elétrico e a abertura do mercado livre são discutidas há mais de 6 anos e, mesmo ainda pendente de uma definição, o Poder Legislativo tem, recentemente, por exemplo, centrado esforços em questões como a prorrogação das concessões de distribuição, que já havia sido endereçada pelo Ministério de Minas e Energia – vide artigo Novas discussões sobre a prorrogação das concessões de distribuição – ou mesmo na discussão do sinal locacional que já havia sido definida pela Aneel.

Toda esta situação pode estar custando energia e tempo preciosos para avançarmos em aspectos relevantes que o mundo está trabalhando, em especial para utilização de novas tecnologias para a transição energética.

Neste ponto, há quem defenda – dada nossa matriz elétrica majoritariamente renovável –, que o Brasil já estaria à frente neste aspecto e que, por ora, sequer seria necessário se falar em transição energética.

Fato é que, dadas as novas tendências mundiais como a exploração de potencial energético offshore, o desenvolvimento do hidrogênio verde e de novas tecnologias de armazenamento ou mesmo do mercado de créditos de carbono – áreas em que já se reconhece o grande potencial brasileiro –, é de extrema relevância que, minimamente, as bases legais e regulatórias estejam bem definidas para que o próprio mercado e os agentes avaliem a melhor forma para explorar.

Neste aspecto, é relevante reconhecer importantes avanços como a edição do Decreto nº 10.946/2022 que estabeleceu regras e diretrizes para a exploração de potenciais offshore, a criação do Plano Nacional do Hidrogênio, ou mesmo o Decreto 11.550/2023 e a Lei nº 14.590/2023 que sinalizam para a exploração do mercado de créditos de carbono no Brasil.

Ocorre que, ainda que com esses relevantes passos iniciais e mesmo que discutível a necessidade de novos marcos legais para avançarmos em algumas destas áreas, fato é que, aparentemente, o mercado e os agentes ainda discutem a necessidade de regras mais claras e detalhadas que garantam a segurança jurídica para o investimento nesses novos potenciais energéticos.

Não à toa, o tema segue sendo discutido no Congresso Nacional, em especial no âmbito do Projeto de Lei nº 576/2021 que trata da geração offshore e do Projeto de Lei nº 725/2022 para exploração do hidrogênio, ambos já tramitando há algum tempo.

É neste cenário, juntamente com a modernização do setor elétrico, é que se entende deveriam estar centrados os esforços do Congresso Nacional em detrimento de outros temas mais técnicos e que podem ser endereçados segundo a competência da Aneel, MME e demais instituições do setor.

E aqui, vale reforçar a necessidade de que essa discussão se dê de forma técnica e, principalmente, no tempo necessário para que as regras e definições para exploração desse enorme potencial energético brasileiro sejam estabelecidas a tempo de receber os já anunciados e significativos investimentos em transição energética sob pena de vermos, mais uma vez, a perda relevante de uma oportunidade, com investimentos sendo destinados a outros países e outras áreas do globo.

Adicionalmente, dada a conexão de todos estes aspectos, também se entende de extrema relevância que essa discussão esteja totalmente alinhada e concatenada com a definição das novas premissas para modernização do setor elétrico que, segundo vem sendo anunciado, deverá ter nova proposta apresentada pelo MME nos próximos meses, momento em que seria oportuno, também avançar nessas propostas.

Por fim, considerando a especificidade técnica de todos estes temas, também é imperioso que os agentes, associações e instituições setoriais participem ativamente desta discussão, seja por meio de consultas ou audiências publicas e também por meio de proposições que possam iniciar as discussões no âmbito do Congresso Nacional.

Frederico Accon é Head de Energia do Stocche Forbes Advogados; Mariana Saragoça é sócia de Energia e Infraestrutura do Stocche Forbes Advogados

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