Opinião
O futuro são todas as bacias brasileiras em Oferta Permanente? Essa é a melhor solução?
Se a opção do Estado for mesmo a Oferta Permanente para além das bacias maduras, é imperativo que a sociedade tenha claro suas consequências e tenha conhecimento de como ela afeta o valor de seus ativos
No último dia 7 de outubro, a ANP licitou 92 blocos exploratórios em quatro bacias diferentes: Campos, Santos, Potiguar e Pelotas. Essa rodada, que acabou com apenas cinco blocos arrematados, bônus e compromisso mínimo de investimento baixíssimos para blocos do pré-sal (R$ 37,14 milhões e R$ 136,345 milhões, respectivamente), foi considerada uma das piores já realizadas, só superada pela 5ª rodada.
Na prática, tanto quanto a 5ª rodada, ela marca o fim de um ciclo, que prometeu licitar áreas de alto potencial, principalmente no pré-sal.
Só que depois de 4 rodadas de concessões com objetivo pré-sal, 6 licitações dentro do polígono do pré-sal, sob regime de partilha de produção, 1 rodada do excedente da cessão onerosa (e outra prevista ainda para esse ano), áreas em oferta permanente que chegaram a encantar a Shell (a petroleira adquiriu o bloco C-M-747, no setor SC-AUP4 da bacia de Campos na 2ª rodada de Oferta Permanente), e com a “Lei da Oferta e Procura” em vigor, não era de se esperar grande entusiasmo para áreas de Novas Fronteiras do Conhecimento (que contam com poucos dados e informações), principalmente em águas profundas e ultraprofundas, com alto risco exploratório, dificuldades logísticas, limitações tecnológicas para seu desenvolvimento (em caso de sucesso exploratório) e incertezas quanto ao licenciamento ambiental.
Em resumo, tratavam-se de áreas de alto risco, em momento em que as petroleiras estão com suas carteiras de projetos lotadas de melhores oportunidades. Mas até aí, nada de novo.
O que há de novo é a necessidade de se discutir a pretensão da ANP de colocar todas as áreas já licitadas e não arrematadas em oferta permanente.
Precisa estar explícito que, ao estender essa possibilidade para além das áreas já maduras, o país voluntariamente abre mão de definir a estratégia de ocupação de suas bacias sedimentares, assim como abre mão da escolha do melhor momento para licitá-las. É preciso ter em mente que, embora esse modelo signifique uma boa possibilidade para os concessionários engordarem seus portfólios com áreas que lhes podem ser úteis no futuro, para a sociedade ele significa a impossibilidade de licitar tais áreas, mais adiante, com melhores preços do petróleo ou mais dados e informações que lhes agreguem maior valor.
Outra questão importante diz respeito ao teor dos contratos de concessão, ora adotados. Ao serem elaborados, no passado, com a premissa de que os baixos preços do petróleo demandavam ações adicionais para atrair o investidor, abriu-se mão da tradicional separação da fase exploratória em períodos, que garantiam investimentos exploratórios ao longo dessa fase.
Com o modelo de concessão atualmente em vigor, que conta com uma fase exploratória de 7 anos para águas profundas, sem nenhuma divisão por períodos, tornou-se possível aos concessionários passar praticamente 7 anos sem realizar qualquer investimento, o que conflita com a lógica dos contratos mundo afora que é o de, uma vez assinados os contratos, tê-los garantindo, ao país hospedeiro, investimentos contínuos e evitando que as empresas priorizem investimentos em um país, em detrimento do outro. Nesses casos, pode-se licitar os blocos, concedê-los com baixos bônus de assinatura, baixos compromissos de investimentos, e ainda ficar sem expectativa desses investimentos por quase 7 anos.
Por tudo isso, é bom ter em mente que a decisão de licitar precisa estar ancorada em premissas claras e objetivos bem definidos. Licitar por licitar não agrega valor! O valor vem do atingimento dos objetivos pretendidos. Mais do que isso, bônus elevados em geral são fruto de áreas bem estudadas, de comprovado potencial, colocadas em licitação em momento adequado (vide que depois da queda dos preços do petróleo em 2014, e do atingimento de valores de cerca de US$ 29/bbl no início de 2016, o petróleo superou a marca dos US$ 80/bbl em 2018, regrediu a cerca de US$ 21/bbl em 2020 e já retornou a valores pré-crise, superando a marca dos US$ 80/bbl). Não se pode esquecer que as licitações realizadas de 2017 a 2020 contaram com tudo isso. Só que esse ciclo parece estar se encerrando, ensejando a necessidade de atenção para novas áreas.
Nesse contexto, se a opção do Estado for mesmo a Oferta Permanente para além das bacias maduras, é imperativo que a sociedade tenha claro suas consequências e tenha conhecimento de como ela afeta o valor de seus ativos.
Se de outra forma for, é recomendável aprofundamento dos estudos das Novas Fronteiras brasileiras, com vistas às próximas licitações, a começar pela Bacia da Foz do Amazonas, região que continha o bloco que mereceu o maior bônus de assinatura da 11ª rodada e que está obtendo um sucesso exploratório imenso na Guiana e no Suriname.
Magda Chambriard é pesquisadora da FGV Energia