Opinião
O sistema financeiro e a transição energética
A principal condicionante da velocidade com que se dará a Transição Energética está no sistema financeiro
O último Fórum de Finanças Sustentáveis da Bloomberg, em Londres no final de junho, foi marcado por, dentre outras exposições, um comunicado conjunto dos CEO’s dos principais bancos globais do mundo a respeito da transição energética.
Os executivos relataram que os bancos estão “espremidos” entre as cobranças cada vez mais intensas de ativistas climáticos na direção do abandono completo dos combustíveis fósseis e a ruptura de contratos por parte dos governadores republicanos do sul dos EUA que alegam que não desejam manter convênios com “bancos de carteira ESG”.
Um caso mais extremo no Texas levou a interrupções de negociações de títulos públicos municipais, um importante instrumento de crédito para entes subnacionais nos EUA. A paralisação foi resultado do boicote institucional a bancos que incentivavam carteiras verdes e que também atuam como corretores de títulos da dívida.
Para além do entendimento de que qualquer tipo de intolerância afasta a racionalidade, basta uma análise microeconômica relativamente simples, no contexto econômico atual, para que a refutação da ansiedade da transição energética ganhe consistência.
Uma primeira observação deve ser feita em relação à composição do setor de energia na cesta de consumo global. As principais notícias do front macroeconômico expressam que as principais economias do mundo enfrentam enorme dificuldade em levar a inflação em cada país para a meta. Isso ocorre depois de um longo período de taxas de juros em terreno contracionista e relativo sucesso na desinflação.
A chamada “última milha”, porém parece ser mais lenta e custosa e grande parte dessa rigidez se dá pelos preços de energia, sobretudo petróleo e gás. Isso fica fácil de ver quando, na decomposição dos dados de inflação, nota-se que as medidas de inflação menos voláteis (os núcleos, que excluem preços de alimentos e energia) estão acima da medida de inflação principal, indicando que os preços de energia são tão relevantes que são capazes de reduzir ainda que transitoriamente a taxa de inflação. Tal importância, via pesos nas ponderações dos índices de preços, reflete tão somente a elevada participação de combustíveis fósseis na composição do produto global.
Essa análise leva à outra, qual seja, que as empresas do setor de óleo e gás ainda não conseguem repor as perdas decorrentes dos custos elevados na esteira do choque de preços da pandemia. A dinâmica desses setores buscará reestabelecer as margens de lucro para repor perdas dos últimos períodos e para isso precisam ganhar escala da produção usando as instalações das plantas já existentes e não iniciar operações em outros setores.
Um segundo e definitivo ponto necessário para a compreensão do quadro diz respeito ao setor financeiro. Não é possível algum tipo de saída repentina do setor uma vez que há contratos firmados que obrigam bancos e instituições financeiras a permanecerem no setor em que os contratos foram celebrados. Mais ainda, qualquer iniciativa de transição de financiamento se daria em um contexto em que os juros globais apresentam substancial volatilidade, inibindo qualquer tipo de entrada em novo financiamento.
No contexto atual, importa a métrica de riscos. É ela quem direciona os fluxos para investimentos e determina a oferta de crédito. O que esse indicador mostra hoje é que a transição energética é elemento central nas tomadas de decisões dos bancos globais, mas há a ciência de que o processo será lento e gradual, e é preciso compreensão por parte de sociedade e governos.
O abandono imediato do setor de combustíveis fósseis não ocorrerá, mas a maior parte dos investimentos feitos no presente está cada vez mais afastada de petróleo e carvão mineral e novos negócios são feitos tendo como escopo a diversificação em energia sustentável. Mas é um caminho longo, muito por conta do reconhecimento tardio da importância do tema.