Opinião
A tributação na cadeia do GN, GLP e Biogás
Análise sobre a incidência de ICMS, ISS, PIS, Cofins e CIDE na cadeia de gás natural, GLP e Biogás
O gás natural (GN) é todo hidrocarboneto que permaneça em estado gasoso nas condições atmosféricas normais, extraído diretamente a partir de reservatórios petrolíferos ou gaseíferos, incluindo gases úmidos, secos, residuais e gases raros. O processo de produção do gás natural ocorre em quatro etapas: (i) exploração e produção; (ii) processamento; (iii) transporte e estocagem e (iv) distribuição.
A extração do gás (aquisição originária), assim como as operações de queima, consumo próprio para geração de energia elétrica ou reinjeção não implicam em transferência de titularidade e, portanto, não devem sofrer a incidência do ICMS. Ao mesmo tempo, é recorrente que Estados e Municípios procurem instituir taxas de fiscalização sobre as atividades de pesquisa, lavra, exploração e aproveitamento de petróleo e gás. Normalmente, referidas taxas têm intuito meramente arrecadatório e invadem a esfera de competência da União (poder de polícia), na qualidade de ente concedente das atividades de exploração e produção, além de conterem outras inconstitucionalidades.
Desde a zona de produção até a malha de distribuição, o transporte do GN pode se dar por gasodutos, transporte marítimo ou terrestre. Na hipótese de importação de GN, a exemplo do gasoduto Brasil-Bolívia, o ICMS-importação será recolhido para o Estado em que estiver localizado o destinatário jurídico da mercadoria. A alíquota do imposto de importação sobre o gás natural é de zero por cento.
Nas operações interestaduais, entre contribuintes, com GN e seus derivados, o imposto será repartido entre os Estados de origem e de destino. Quando a operação interestadual for destinada a não contribuinte, o imposto caberá ao Estado de origem. Portanto, a determinação sobre qual Estado deve receber o tributo depende da análise da destinação do gás: se é para consumo (Estado de origem) ou não (Estados de origem e destino).
A receita do transportador, ainda que vinculada a uma cláusula ship or pay, está sujeita à tributação pelo PIS/COFINS. O carregador submetido ao regime não-cumulativo de apuração de PIS/COFINS, tem direito a crédito desses tributos, mesmo que exista uma cláusula de ship or pay no contrato de transporte.
A demanda contratada pode compreender ou não o valor referente ao fornecimento do gás. Até o montante que compreende o gás, há incidência de ICMS. Na parte não coberta pelo fornecimento, não incide o imposto estadual. Não se tributa contrato! Naturalmente, se os pontos de recebimento e de entrega do gasoduto se limitarem a um único Município (transporte intramunicipal), a incidência será do ISS, não do ICMS.
Após ser enviado para a Unidade de Processamento de Gás Natural (UPGN), o GN sofre industrialização, gerando, dentre outros, o GN canalizado e o Gás Liquefeito de Petróleo (GLP – gás de cozinha, envasado).
A saída do gás da UPGN é fato gerador do ICMS. Por outro lado, no ponto de entrega (City Gate), o gás “upgenado” não sofre qualquer industrialização, pois ali entra já processado. A natureza do produto permanece inalterada, não havendo agregação de valor para fins de ICMS. Filtragem, aquecimento, redução de pressão e medição são medidas de segurança para a entrega do gás às distribuidoras estaduais, além de serem realizadas no interesse do transporte. Aliás, o ponto de entrega não é estabelecimento para fins do imposto estadual.
A malha de distribuição leva o GN até o cliente final. Cabe aos Estados explorar diretamente, ou mediante concessão a empresa estatal, com exclusividade de distribuição, os serviços locais de gás canalizado. Os comercializadores não recolhem PIS/COFINS, já que as distribuidoras assim o fazem em razão do regime monofásico.
O GLP é uma mistura de hidrocarbonetos com alta pressão de vapor, obtida do gás natural em unidades de processo especiais, que é mantida na fase líquida em condições especiais de armazenamento na superfície. As operações de importação e de comercialização de GLP derivado do GN sofrem a incidência da CIDE-combustíveis, mas não se pode aplicar o mesmo raciocínio para os gases propano e butano, por serem produtos distintos do GLP, embora o componham.
A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, contudo, possui um precedente em sentido diverso (REsp n. 1476051/PE), validando a tributação sobre o propano e o butano, isoladamente. Não concordarmos com tal posicionamento, pois se a lei prevê a tributação do todo (GLP), não se pode concluir que as partes (propano e butano) possam também ser tributadas. Ademais, o GLP não é gênero e espécie simultaneamente. Trata-se de contradição lógica.
Vale ressaltar que uma das destinações obrigatórias da CIDE-combustíveis é o pagamento de subsídios a transporte de gás natural. A incidência monofásica de PIS/COFINS se aplica ao GLP.
Define-se como biogás o gás oriundo do processo de biodigestão anaeróbica de resíduos orgânicos, sobretudo, provenientes de produção agrícola e pecuária, aterros sanitários, estações de tratamento de efluentes, entre outras fontes geradoras e que seja composto majoritariamente de metano. Após ser purificado, se transforma em biometano. O biogás serve como combustível e para geração de energia elétrica.
A venda do biogás se submete à incidência do ICMS, do PIS e da COFINS. Para que o biogás seja produzido em grande escala, é importante a adoção de política fiscal que garanta a concessão de benefícios fiscais. Afinal, seu custo é maior do que o do gás natural convencional. Os Estados da Bahia, Mato Grosso, Rio de Janeiro e São Paulo estão autorizados a conceder redução da base de cálculo do ICMS nas saídas internas com biogás e biometano, de tal forma que a carga tributária do imposto resulte na aplicação do percentual de 12% (doze por cento) sobre o valor da operação.
Base legal:
GN: CF/88, art. 155, § 4º, II e III, Lei 11.909/09, Lei 9.478/97, art. 6º, II. Gás natural canalizado: CF/88, art. 25, § 2º, Lei 9.478/97, art. 6º, XXII. GLP: Lei n. 10.336/01, art. 3º, V. Biogás: Lei 12.305/10, art. 44, inc. IV e V, Convênio ICMS 112/2013.